O guardador de rebanhos
Eu nunca guardei rebanhos, Mas é como se os guardasse. Minha alma é como um pastor, Conhece o vento e o sol E anda pela mão das Estações A seguir e a olhar. Toda a paz da Natureza sem gente Vem sentar-se a meu lado. Mas eu fico triste como um pôr de sol Para a nossa imaginação, Quando esfria no fundo da planície E se sente a noite entrada Como uma borboleta pela janela.
Mas a minha tristeza é sossego Porque é natural e justa E é o que deve estar na alma Quando já pensa que existe E as mãos colhem flores sem ela dar por isso.
Como um ruído de chocalhos Para além da curva da estrada, Os meus pensamentos são contentes. Só tenho pena de saber que eles são contentes, Porque, se o não soubesse, Em vez de serem contentes e tristes, Seriam alegres e contentes.
Pensar incomoda como andar à chuva Quando o vento cresce e parece que chove mais.
Não tenho ambições nem desejos Ser poeta não é uma ambição minha É a minha maneira de estar sozinho.
E se desejo às vezes Por imaginar, ser cordeirinho (Ou ser o rebanho todo Para andar espalhado por toda a encosta A ser muita cousa feliz ao mesmo tempo),
É só porque sinto o que escrevo ao pôr do sol, Ou quando uma nuvem passa a mão por cima da luz E corre um silêncio pela erva fora.
Fernando Pessoa
Outras frases de Fernando Pessoa
+ We torture our brother men with hate, spite, evil, and then say “the world is bad”. Torturamos os nossos irmãos homens com o ódio, o rancor, a maldade e depois dizemos «o mundo é mau». (Aforismos e afins) - Fernando Pessoa
+ Viver é ser outro. Nem sentir é possível se hoje se sente como ontem se sentiu: sentir hoje o mesmo que ontem não é sentir - é lembrar hoje o que se sentiu ontem, ser hoje o cadáver vivo do que ontem foi a vida perdida. - Fernando Pessoa
+ Viver não é necessário. Necessário é criar. - Fernando Pessoa
+ Vivem em nós inúmeros - Fernando Pessoa
+ Viver é ser outro. Nem sentir é possível se hoje se sente como ontem se sentiu: sentir hoje o mesmo que ontem não é sentir — é lembrar hoje o que se sentiu ontem, ser hoje o cadáver vivo do que ontem foi a vida perdida. Apagar tudo do quadro de um dia para o outro, ser novo com cada nova madrugada, numa revirgindade perpétua da emoção — isto, e só isto, vale a pena ser ou ter, para ser ou ter o que imperfeitamente somos. - Fernando Pessoa