Frases de Carlos Drummond De Andrade
+ Amor Entre um e outro amor, é aconselhável um pouco de respiração. - Carlos Drummond De Andrade
+ Amor é o que se aprende no limite, depois de se arquivar toda a ciência herdada, ouvida. Amor começa tarde. - Carlos Drummond De Andrade
+ Amor Amar pela segunda vez o que foi nosso é tão surpreendente que constitui outra primeira vez. - Carlos Drummond De Andrade
+ Ambição A ambição torna os homens audazes; a audácia sem ambição é privilégio de poucos. - Carlos Drummond de Andrade, In: O Avesso das Coisas - 6º Edição, 2007. - Carlos Drummond De Andrade
+ Alma Prisioneira do corpo, a alma vive em guerra com o carcereiro. - Carlos Drummond De Andrade
+ Adultério No adultério há pelo menos três pessoas que se enganam. - Carlos Drummond de Andrade, In: O Avesso das Coisas - 6º Edição, 2007. - Carlos Drummond De Andrade
+ — A unanimidade comporta uma parcela de entusiasmo, uma de conveniência e uma de desinformação. - Carlos Drummond De Andrade
+ A TORRE SEM DEGRAUS No térreo se arrastam possuidores de ciosas recoisificadas. No 1.° andar vivem depositários de pequenas convicções, mirando-as, remirando-as com lentes de contato. No 2.° andar vivem negadores de pequenas convicções, pequeninos eles mesmos. No 3.° andar - tlás tlás - a noite cria morcegos. No 4.°, no 7.°, vivem amorosos sem amor, desamorando. No 5.°, alguém semeou de pregos dentes de feras vacos de espelho a pista encerada para o baile de debutantes de 1848. No 6.°, rumina-se política na certeza-esperança de que a ordem precisa mudar deve mudar há de mudar, contanto que não se mova um alfinete para isso. No 8.°, ao abandono, 255 cartas registradas não abertas selam o mistério da expedição dizimada por índios Anfika. No 9.°, cochilam filósofos observados por apoftegmas que não chegam a conclusão plausível. Mo 10.°, o rei instala seu gabinete secreto e esconde a coroa de crisógrasos na terrina. No 11.°, moram (namoram?) virgens contidas em cinto de castidades. No 12.°, o aquário de peixes fosforecentes ilumina do teto a poltrona de um cego de nascença. Atenção, 13.°. Do 24.° baixará às 23h um pelotão para ocupar-te e flitar a bomba suja, de que te dizes depositário. No 15.°, o último leitor de Dante, o último de Cervantes, o último de Musil, o último do Diário Oficial dizem adeus à palavra impressa. No 16.°, agricultores protestam contra a fusão de sementes que faz nascerem cereais invertidos e o milho produzir crianças. No 17.°, preparam-se orações de sapiência, tratados internacionais, bulas de antibióticos. Não se sabe o que aconteceu ao 18.°, suprimido da Torre. No 19.° profetas do Antigo Testamento conferem profecias no computador analógico. No 20.°, Cacex Otan Emfa Joc Juc Fronap FBI Usaid Cafesp Alalc Eximbanc trocam de letras, viram Xfp, Jjs, IxxU e que sei mais. Mo 22;°, banqueiros incineram duplicatas vencidas, e das cinzas nascem novas duplicatas. NO 23.°, celebra-se o rito do boi manso, que de tão manso ganhou biograifa e auréola. No 24.°, vide 13.°. No 25.°, que fazes tu, morcego do 3.°? que fazes tu, miss adormecida na passarela? No 26.°., nossas sombras despregadas dos corpos passseiam devagar, cumprimentando-se. O 27.° é uma clínica de nervosos dirigida por general-médico reformado, e em que aos sábados todos se curam para adoecer de novo na segunda-feira. Do 28.° saem boatos de revolução e cruzam com outros de contra-revolução. Impróprio a qualquer uso que não seja o prazer, o 29.° foi declarado inabitável. Excesso de lotação no 30.°: moradores só podem usar um olho, uma perna, meias palavras. No 31.°, a Lei afia seu arsenal de espadas inofensivas, e magistrados cobrem-se com cinzas de ovelhas sacrificadas. No 32.°, a Guerra dos 100 Anos continua objeto de análise acuradíssima. No 33.°, um homem pede pra ser crucificado e não lhe prestam atenção. No 34.°, um ladrão sem ter o que roubar rouba o seu próprio relógio. No 35.°, queixam-se da monotonia deste poema e esquecem-se da monotonia da Torre e das queixas. Um mosquito é, no 36.°, único sobrevivente do que foi outrora residência movimentada com jantares óperas pavões. No 37.°, a canção Filorela amarlina lousileno i flanura meleglírio omoldana plunigiário olanin. No 38.°, o parlamento sem voz, admitido por todos os regimes, exercita-se na mímica de orações. No 39.°, a celebração ecumênica dos anjos da luz e dos anjos da treva, sob a presidência de um meirinho surdo. No 40.°, só há uma porta uma porta uma porta. Que se abre para o 41.°, deixando passar esqueletos algemados e coduzidos por fiscais do Imposto de Consciência. No 42.°, goteiras formam um lago onde bóiam ninféias, e ninfetas executam bailados quentes. No 43.°, no 44.°, no... continua indefinidamente). - Carlos Drummond De Andrade
+ A superioridade do animal sobre o homem está, entre outras coisas, na discrição com que sofre. - Carlos Drummond De Andrade
+ "A religião ocupa espaço infinito dentro do homem, sem que este perca as limitações humanas." - Carlos Drummond De Andrade
+ A noite anoiteceu tudo. O mundo não tem remédio. Os suicidas tinham razão. - Carlos Drummond De Andrade
+ A minha vontade é forte,mais minha vontade de exceção é fraca. - Carlos Drummond De Andrade
+ A Mesa (excerto) E não gostavas de festa... Ó velho, que festa grande Hoje te faria a gente. E teus filhos que não bebem E o que gosta de beber, Em torno da mesa larga, Largavam as tristes dietas, Esqueciam seus fricotes, E tudo era farra honesta Acabando em confidencia. Ai, velho, ouviria coisas De arrepiar teus noventa. ....... Pois sim. Teu olho cansado, Mas afeito a ler no campo Uma lonjura de léguas Entrava-nos alma adentro E com pesar nos fitava E com ira amaldiçoava E com doçura perdoava (Perdoar é rito dos pais, Quando não seja de amantes) "......." Mais adiante vês aquele Que de ti herdou a dura Vontade, o duro estoicismo. Mas, não quis te repetir. Achou não valer a pena Reproduzir sobre a terra O que a terra engolirá. Amou. E ama. E amará. Só não quer seu amor seja uma prisão de dois, Um contrato, entre bocejos E quatro pés de chinelo. ..... Mas estamos todos vivos. E mais que vivos, alegres. Ninguém dirá que ficou faltando Algum dos teus. Por exemplo: Ali ao canto da mesa, Ali me vês tu. Que tal? Fica tranquilo: trabalho. Afinal, a boa vida Ficou apenas: a vida ( e nem era assim tão boa E nem se fez muito má). Pois ele sou eu. Repara: Tenho todos os defeitos Que não farejei em ti, E nem os tenho que tinhas, Quanto mais as qualidades. Não importa: sou teu filho Com ser uma negativa Maneira de te afirmar. ..... Tão ralo prazer te dei, Nenhum, talvez... Ou senão, esperança de prazer, É, pode ser que te desse A neutra satisfação De alguém sentir que seu filho, De tão inútil, seria Sequer um sujeito ruim. Não sou um sujeito ruim. Descansa, se o suspeitavas, Mas não sou lá essas coisas. Alguns afetos recortam O meu coração chateado. Se me chateio? Demais. Esse é meu mal. Não herdei De ti essa balda. ....... - Carlos Drummond De Andrade
+ A Máquina do Mundo E como eu palmilhasse vagamente uma estrada de Minas, pedregosa, e no fecho da tarde um sino rouco se misturasse ao som de meus sapatos que era pausado e seco; e aves pairassem no céu de chumbo, e suas formas pretas lentamente se fossem diluindo na escuridão maior, vinda dos montes e de meu próprio ser desenganado, a máquina do mundo se entreabriu para quem de a romper já se esquivava e só de o ter pensado se carpia. Abriu-se majestosa e circunspecta, sem emitir um som que fosse impuro nem um clarão maior que o tolerável pelas pupilas gastas na inspeção contínua e dolorosa do deserto, e pela mente exausta de mentar toda uma realidade que transcende a própria imagem sua debuxada no rosto do mistério, nos abismos. Abriu-se em calma pura, e convidando quantos sentidos e intuições restavam a quem de os ter usado os já perdera e nem desejaria recobrá-los, se em vão e para sempre repetimos os mesmos sem roteiro tristes périplos, convidando-os a todos, em coorte, a se aplicarem sobre o pasto inédito da natureza mítica das coisas, assim me disse, embora voz alguma ou sopro ou eco ou simples percussão atestasse que alguém, sobre a montanha, a outro alguém, noturno e miserável, em colóquio se estava dirigindo: "O que procuraste em ti ou fora de teu ser restrito e nunca se mostrou, mesmo afetando dar-se ou se rendendo, e a cada instante mais se retraindo, olha, repara, ausculta: essa riqueza sobrante a toda pérola, essa ciência sublime e formidável, mas hermética, essa total explicação da vida, esse nexo primeiro e singular, que nem concebes mais, pois tão esquivo se revelou ante a pesquisa ardente em que te consumiste... vê, contempla, abre teu peito para agasalhá-lo.” As mais soberbas pontes e edifícios, o que nas oficinas se elabora, o que pensado foi e logo atinge distância superior ao pensamento, os recursos da terra dominados, e as paixões e os impulsos e os tormentos e tudo que define o ser terrestre ou se prolonga até nos animais e chega às plantas para se embeber no sono rancoroso dos minérios, dá volta ao mundo e torna a se engolfar, na estranha ordem geométrica de tudo, e o absurdo original e seus enigmas, suas verdades altas mais que todos monumentos erguidos à verdade: e a memória dos deuses, e o solene sentimento de morte, que floresce no caule da existência mais gloriosa, tudo se apresentou nesse relance e me chamou para seu reino augusto, afinal submetido à vista humana. Mas, como eu relutasse em responder a tal apelo assim maravilhoso, pois a fé se abrandara, e mesmo o anseio, a esperança mais mínima — esse anelo de ver desvanecida a treva espessa que entre os raios do sol inda se filtra; como defuntas crenças convocadas presto e fremente não se produzissem a de novo tingir a neutra face que vou pelos caminhos demonstrando, e como se outro ser, não mais aquele habitante de mim há tantos anos, passasse a comandar minha vontade que, já de si volúvel, se cerrava semelhante a essas flores reticentes em si mesmas abertas e fechadas; como se um dom tardio já não fora apetecível, antes despiciendo, baixei os olhos, incurioso, lasso, desdenhando colher a coisa oferta que se abria gratuita a meu engenho. A treva mais estrita já pousara sobre a estrada de Minas, pedregosa, e a máquina do mundo, repelida, se foi miudamente recompondo, enquanto eu, avaliando o que perdera, seguia vagaroso, de mãos pensas. (Texto foi extraído do livro “Nova Reunião”, José Olympio Editora – Rio de Janeiro, 1985, pág. 300. Fonte: Projeto Releituras) - Carlos Drummond De Andrade
+ A folha por: Carlos Drummond de Andrade A natureza são duas. Uma, tal qual se sabe a si mesma. Outra, a que vemos. Mas vemos? Ou a ilusão das coisas? Quem sou eu para sentir o leque de uma palmeira? Quem sou, para ser senhor de uma fechada, sagrada arca de vidas autônomas? A pretensão de ser homem e não coisa ou caracol esfacela-me em frente folha que cai, depois de viver intensa, caladamente, e por ordem do Prefeito vai sumir na varredura mas continua em outra folha alheia a meu privilégio de ser mais forte que as folhas. - Carlos Drummond De Andrade
+ "A fé e a incredulidade trocam de lugar a todo momento no homem curioso”. (em "O avesso das Coisas". São Paulo: Editora Record, 2007.) - Carlos Drummond De Andrade
+ A educação para o sofrimento evitaria senti-lo com relação a casos que não o merecem. - Carlos Drummond De Andrade
+ “A beleza ainda me emociona muito. Não só a beleza física, mas a beleza natural. Hoje, com quase oitenta e cinco anos, tenho uma visão da natureza muito mais rica do que eu tinha quando era jovem”. ( trecho da última entrevista. in: "O suplemento Idéias", do Jornal do Brasil, de 22 de agosto de 1987.) - Carlos Drummond De Andrade
+ À beira do negro poço debruço-me, nada alcanço decerto perdi os olhos que tinha quando criança. - Carlos Drummond De Andrade
+ A ambição torna os homens audazes; a audácia sem ambição é privilégio de poucos. - Carlos Drummond De Andrade
+ A alfabetização é a primeira coluna da estrutura social; o analfabetismo pode ser a segunda. - Carlos Drummond De Andrade
+ A administração, organismo autoritário, é feita de papel, isto é, de figuração de coisas. (In: O Avesso das Coisas - 6º Edição, 2007.) - Carlos Drummond De Andrade
+ Um chamado João João era fabulista? fabuloso? fábula? Sertão místico disparando no exílio da linguagem comum? Projetava na gravatinha a quinta face das coisas, inenarrável narrada? Um estranho chamado João para disfarçar, para farçar o que não ousamos compreender? Tinha pastos, buritis plantados no apartamento? no peito? Vegetal ele era ou passarinho sob a robusta ossatura com pinta de boi risonho? Era um teatro e todos os artistas no mesmo papel, ciranda multívoca? João era tudo? tudo escondido, florindo como flor é flor, mesmo não semeada? Mapa com acidentes deslizando para fora, falando? Guardava rios no bolso, cada qual com a cor de suas águas? sem misturar, sem conflitar? E de cada gota redigia nome, curva, fim, e no destinado geral seu fado era saber para contar sem desnudar o que não deve ser desnudado e por isso se veste de véus novos? Mágico sem apetrechos, civilmente mágico, apelador de precípites prodígios acudindo a chamado geral? Embaixador do reino que há por trás dos reinos, dos poderes, das supostas fórmulas de abracadabra, sésamo? Reino cercado não de muros, chaves, códigos, mas o reino-reino? Por que João sorria se lhe perguntavam que mistério é esse? E propondo desenhos figurava menos a resposta que outra questão ao perguntante? Tinha parte com... (não sei o nome) ou ele mesmo era a parte de gente servindo de ponte entre o sub e o sobre que se arcabuzeiam de antes do princípio, que se entrelaçam para melhor guerra, para maior festa? Ficamos sem saber o que era João e se João existiu de se pegar. - Carlos Drummond De Andrade
+ Tudo é possível só eu impossível. - Carlos Drummond De Andrade
+ Tudo é mais simples diante de um copo d’água. - Carlos Drummond De Andrade