Frases de Clarice Lispector
+ O que escrevo não pede favor a ninguém e não implora socorro: aguenta-se na sua chamada dor com uma dignidade de barão. - Clarice Lispector
+ O que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesma. - Clarice Lispector
+ O que é um espelho? É o único material inventado que é natural. Quem olha um espelho, quem consegue vê-lo sem se ver,quem entende que a sua profundidade consiste em ele ser vazio (...) esse alguém percebeu o seu mistério de coisa. - Clarice Lispector
+ O que é um espelho? É o único material inventado que é natural. Quem olha um espelho conseguindo ao mesmo tempo isenção de si mesmo, quem consegue vê-lo sem se ver, quem entende que sua profundidade é ele ser vazio, quem caminha para dentro do seu espaço transparente sem deixar nele o vestígio da própria imagem - então percebeu o seu mistério. - Clarice Lispector
+ – O que é que se consegue quando se fica feliz?, sua voz era uma seta clara e fina. A professora olhou para Joana. – Repita a pergunta...? Silêncio. A professora sorriu arrumando os livros. – Pergunte de novo, Joana, eu é que não ouvi. – Queria saber: depois que se é feliz o que acontece? O que vem depois? – repetiu a menina com obstinação. A mulher encarava-a surpresa. – Que ideia! Acho que não sei o que você quer dizer, que ideia! Faça a mesma pergunta com outras palavras... – Ser feliz é para se conseguir o quê? - Clarice Lispector
+ O que é que se consegue quando se fica feliz? (Perto do Coração Selvagem) - Clarice Lispector
+ O que é que há? Pois estou ouvindo acordes de piano alegre - será isto o símbolo de que a vida da moça iria ter um futuro esplendoroso? Estou contente com essa possibilidade e farei tudo para que esta se torne real. (A hora da estrela) - Clarice Lispector
+ O que é preciso é não ir demais contra a onda. A gente faz como quando toma banho de mar: procura subir e descer com a onda. Isso é uma forma de lutar: esperar, ter paciência, perdoar, amar os outros. E cada dia aperfeiçoar o dia. Tudo isso está parecendo idiota... Mas até que não é. - Clarice Lispector
+ O que deve fazer alguém que não sabe o que fazer de si? Utilizar-se como corpo e alma em proveito do corpo e da alma? Ou transformar sua força em força alheia? Ou esperar que de si mesma nasça, como uma consequência, a solução? Nada posso dizer ainda dentro da forma. Tudo o que possuo está muito fundo dentro de mim. - Clarice Lispector
+ O que deve fazer alguém que não sabe o que fazer de si? - Clarice Lispector
+ O que chamo de morte me atrai tanto que só posso chamar de valoroso o modo como, por solidariedade com os outros, eu ainda me agarro ao que chamo de vida. Seria profundamente amoral não esperar, como os outros esperam, pela hora, seria esperteza demais a minha de avançar no tempo, e imperdoável ser mais sabida do que os outros. Por isso, apesar da intensa curiosidade, espero. - Clarice Lispector
+ O que aprendi, já esqueci, mas tenho a certeza de que de algum modo ficou em mim. - Clarice Lispector
+ O que a nossa imaginação cria se parece com o processo que Deus tem de criar. - Clarice Lispector
+ O problema para quem escreve é antes de tudo um problema literário – mas pergunto-lhe agora: é ainda um problema literário a falta de pés no chão ou é anterior a ele? - Clarice Lispector
+ O PRIMEIRO BEIJO Os dois mais murmuravam que conversavam: havia pouco iniciara-se o namoro e ambos andavam tontos, era o amor. Amor com o que vem junto: ciúme. - Está bem, acredito que sou a sua primeira namorada, fico feliz com isso. Mas me diga a verdade, só a verdade: você nunca beijou uma mulher antes de me beijar? Ele foi simples: - Sim, já beijei antes uma mulher. - Quem era ela? perguntou com dor. Ele tentou contar toscamente, não sabia como dizer. O ônibus da excursão subia lentamente a serra. Ele, um dos garotos no meio da garotada em algazarra, deixava a brisa fresca bater-lhe no rosto e entrar-lhe pelos cabelos com dedos longos, finos e sem peso como os de uma mãe. Ficar às vezes quieto, sem quase pensar, e apenas sentir - era tão bom. A concentração no sentir era difícil no meio da balbúrdia dos companheiros. E mesmo a sede começara: brincar com a turma, falar bem alto, mais alto que o barulho do motor, rir, gritar, pensar, sentir, puxa vida! como deixava a garganta seca. E nem sombra de água. O jeito era juntar saliva, e foi o que fez. Depois de reunida na boca ardente engulia-a lentamente, outra vez e mais outra. Era morna, porém, a saliva, e não tirava a sede. Uma sede enorme maior do que ele próprio, que lhe tomava agora o corpo todo. A brisa fina, antes tão boa, agora ao sol do meio dia tornara-se quente e árida e ao penetrar pelo nariz secava ainda mais a pouca saliva que pacientemente juntava. E se fechasse as narinas e respirasse um pouco menos daquele vento de deserto? Tentou por instantes mas logo sufocava. O jeito era mesmo esperar, esperar. Talvez minutos apenas, enquanto sua sede era de anos. Não sabia como e por que mas agora se sentia mais perto da água, pressentia-a mais próxima, e seus olhos saltavam para fora da janela procurando a estrada, penetrando entre os arbustos, espreitando, farejando. O instinto animal dentro dele não errara: na curva inesperada da estrada, entre arbustos estava... o chafariz de onde brotava num filete a água sonhada. O ônibus parou, todos estavam com sede mas ele conseguiu ser o primeiro a chegar ao chafariz de pedra, antes de todos. De olhos fechados entreabriu os lábios e colou-os ferozmente ao orifício de onde jorrava a água. O primeiro gole fresco desceu, escorrendo pelo peito até a barriga. Era a vida voltando, e com esta encharcou todo o seu interior arenoso até se saciar. Agora podia abrir os olhos. Abriu-os e viu bem junto de sua cara dois olhos de estátua fitando-o e viu que era a estátua de uma mulher e que era da boca da mulher que saía a água. Lembrou-se de que realmente ao primeiro gole sentira nos lábios um contato gélido, mais frio do que a água. E soube então que havia colado sua boca na boca da estátua da mulher de pedra. A vida havia jorrado dessa boca, de uma boca para outra. Intuitivamente, confuso na sua inocência, sentia intrigado: mas não é de uma mulher que sai o líquido vivificador, o líquido germinador da vida... Olhou a estátua nua. Ele a havia beijado. Sofreu um tremor que não se via por fora e que se iniciou bem dentro dele e tomou-lhe o corpo todo estourando pelo rosto em brasa viva. Deu um passo para trás ou para frente, nem sabia mais o que fazia. Perturbado, atônito, percebeu que uma parte de seu corpo, sempre antes relaxada, estava agora com uma tensão agressiva, e isso nunca lhe tinha acontecido. Estava de pé, docemente agressivo, sozinho no meio dos outros, de coração batendo fundo, espaçado, sentindo o mundo se transformar. A vida era inteiramente nova, era outra, descoberta com sobressalto. Perplexo, num equilíbrio frágil. Até que, vinda da profundeza de seu ser, jorrou de uma fonte oculta nele a verdade. Que logo o encheu de susto e logo também de um orgulho antes jamais sentido: ele... Ele se tornara homem. - Clarice Lispector
+ O presente Amor será dar de presente ao outro a própria solidão? Pois é a coisa mais última que se pode dar de si. - Clarice Lispector
+ O pré-amor, que é tão mais feliz que amor. - Clarice Lispector
+ O prazer nascendo dói tanto no peito que se prefere sentir a habituada dor ao insólito prazer. - Clarice Lispector
+ O prazer é abrir as mãos e deixar escorrer sem avareza o vazio-pleno que se estava encarniçadamente prendendo. E de súbito o sobressalto: ah, abri as mãos e o coração, e não estou perdendo nada! E o susto: acorde, pois há o perigo do coração estar livre! Até que se percebe que nesse espraiar-se está o prazer muito perigoso de ser. Mas vem uma segurança estranha: sempre ter-se-á o que gastar. Não ter pois avareza com esse vazio-pleno: gastá-lo. - Clarice Lispector
+ O pouco que sei não dá para compreender a vida, então a explicação está no que desconheço e que tenho a esperança de poder vir a conhecer um pouco mais. - Clarice Lispector
+ "O ponto de partida deve ser: “Não sei.” O que é uma entrega total." - Clarice Lispector
+ O ponto de partida deve ser: "Não sei". O que é uma entrega total. - Clarice Lispector
+ O pior momento de sua vida era nesse dia ao fim da tarde: caía em meditação inquieta, o vazio do seco domingo. Tinha saudade de quando era pequena – farofa seca – e pensava que fora feliz. - Clarice Lispector
+ O pior é que sou vice-versa e em ziguezague. Sou inconcludente. Mas é preciso me amar como involuntariamente sou. Apenas me responsabilizo pelo que há de voluntário em mim e que é muito pouco. - Clarice Lispector
+ O pior é que ela poderia riscar tudo o que pensara. Seus pensamentos eram, depois de erguidos, estátuas no jardim e ela passava pelo jardim olhando e seguindo o seu caminho. Estava alegre nesse dia, bonita também. Um pouco de febre também. Por que esse romantismo: um pouco de febre? Mas a verdade é que tenho mesmo: olhos brilhantes, essa força e essa fraqueza, batidas desordenadas do coração. Quando a brisa leve, a brisa de verão, batia no seu corpo, todo ele estremecia de frio e calor. E então ela pensava muito rapidamente, sem poder parar de inventar. É porque estou muito nova ainda e sempre que me tocam ou não me tocam, sinto — refletia. - Clarice Lispector