Frases de Guimarães Rosa

+ Ah, não; amigo, para mim, é diferente. Não é um ajuste de um dar serviço ao outro, e receber, e saírem por este mundo, barganhando ajudas, ainda que sendo com o fazer a injustiça aos demais. Amigo, para mim, é só isto: é a pessoa com quem a gente gosta de conversar, do igual o igual, desarmado. O de que um tira prazer de estar próximo. Só isto, quase; e os todos sacrifícios. Ou – amigo – é que a gente seja, mas sem precisar de saber o por que é que é. - Guimarães Rosa

+ A colheita é comum, mas o capinar é sozinho. - Guimarães Rosa

+ Porque a cabeça da gente é uma só, e as coisas que há e que estão para haver são demais de muitas, muito maiores diferentes, e a gente tem de necessitar de aumentar a cabeça, para o total. Todos os sucedidos acontecendo, o sentir forte da gente - o que produz os ventos. Só se pode viver perto de outro, e conhecer outra pessoa, sem perigo de ódio, se a gente tem amor. Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura. - Guimarães Rosa

+ Rezar muito. E ter fé. Porque as coisas estão todas amarradinhas é em Deus. - Guimarães Rosa

+ Deus come escondido, e o Diabo sai por toda a parte lambendo o prato. - Guimarães Rosa

+ o coqueiro coqueirando as manobras do vermelho no branqueado do azul - Guimarães Rosa

+ Julgamento é sempre defeituoso, porque o que a gente julga é o passado. - Guimarães Rosa

+ Que isso foi o que sempre me invocou, o senhor sabe: eu careço de que o bom seja bom e o ruim ruim, que dum lado esteja o preto e do outro o branco, que o feio fique bem apartado do bonito e a alegria longe da tristeza! Quero os todos pastos demarcados... Como é que posso com este mundo? (...) Este mundo é muito misturado... - Guimarães Rosa

+ As coisas assim a gente não perde nem abarca. Cabem é no brilho da noite. Aragem do sagrado. Absolutas estrelas. - Guimarães Rosa

+ Um sentir é o do sentente, mas o outro é do sentidor. - Guimarães Rosa

+ Chegando na encruziada tive que me arrezolver... prá esquerda fui contigo... Coração soube escolher - Guimarães Rosa

+ Ah, mas a fé nem vê a desordem ao redor. - Guimarães Rosa

+ Tudo o que muda a vida vem quieto no escuro, sem preparos de avisar. - Guimarães Rosa

+ Merece de a gente aproveitar o que vem e que se pode, o bom da vida é só de chuvisco. - Guimarães Rosa

+ As pessoas não morrem, ficam encantadas! - Guimarães Rosa

+ O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim, esquenta e esfria, aperta e depois afrouxa e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem. O que Deus quer é ver a gente aprendendo a ser capaz de ficar alegre e amar, no meio da tristeza. Todo caminho da gente é resvaloso, mas cair não prejudica demais. A gente levanta, a gente sabe, a gente volta. - Guimarães Rosa

+ Cada criatura é um rascunho a ser retocado sem cessar. - Guimarães Rosa

+ O rio não quer chegar, mas ficar largo e profundo... - Guimarães Rosa

+ Sempre sei, realmente. Só o que eu quis, todo o tempo, o que eu pelejei para achar, era uma coisa só - a inteira - cujo significado e vislumbrado dela eu vejo que sempre tive. A que era: que existe uma receita, a norma dum caminho certo, estreito, de cada uma pessoa viver - e essa pauta cada um tem - mas a gente mesmo, no comum, não sabe encontrar; como é que, sozinho, por si, alguém ia poder encontrar e saber? - Guimarães Rosa

+ PÍLULAS DO GRANDE SERTÃO Coração da gente – o escuro, escuros. Quem ama é sempre muito escravo, mas não obedece nunca de verdade. Querer o bem com demais força, de incerto jeito, pode já estar sendo se querendo o mal, por principiar. No sistema de jagunços, amigo era o braço, e o aço! Amigo, para mim, é só isto: é a pessoa com quem a gente gosta de conversar, do igual o igual, desarmado. O de que um tira prazer de estar próximo. Só isto, quase; e os todos sacrifícios. Ou – amigo – é que a gente seja, mas sem precisar de saber o por quê é que é. O amor? Pássaro que põe ovos de ferro. Vivendo, se aprende; mas o que se aprende, mais, é só a fazer outras maiores perguntas. A colheita é comum, mas o capinar é sozinho. O diabo, é às brutas; mas Deus é traiçoeiro! O diabo, na rua, no meio do redemunho. O Arrenegado, o Cão, o Cramulhão, o Indivíduo, o Galhardo, o Pé-de-Pato, o Sujo, o Homem, o Tisnado, o Coxo, o Temba, o Azarape, o Coisa-Ruim, o Mafarro, o Pé-Preto, o Canho, o Duba-Dubá, o Rapaz, o Tristonho, o Não-sei-que-diga, O-que-nunca-se-ri, o Sem-Gracejos... Pois, não existe! E, se não existe, como é que se pode se contratar pacto com ele? Quem muito se evita, se convive. Julgamento é sempre defeituoso, porque o que a gente julga é o passado. O que lembro, tenho. Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende. Quem mói no asp'ro, não fantaseia. Quando se curte raiva de alguém, é a mesma coisa que se autorizar que essa própria pessoa passe durante o tempo governando a ideia e o sentir da gente. Vingar... é lamber, frio, o que outro cozinhou quente demais. Quem sabe do orgulho, quem sabe da loucura alheia? Ser chefe – por fora um pouquinho amarga; mas, por dentro, é rosinhas flores. Um chefe carece de saber é aquilo que ele não pergunta. Comandar é só assim: ficar quieto e ter mais coragem. Toda saudade é uma espécie de velhice. Riu, de me dar nojo. Mas nojo medo é, é não? Um sentir é o do sentente, mas outro é o do sentidor. Tudo é e não é. Mocidade é tarefa para mais tarde se desmentir. Sertão é onde manda quem é forte, com as astúcias. Deus mesmo, quando vier, que venha armado! O sertão é do tamanho do mundo. Sertão: é dentro da gente. O sertão é sem lugar. O sertão não tem janelas nem portas. E a regra é assim: ou o senhor bendito governa o sertão, ou o sertão maldito vos governa. O sertão não chama ninguém às claras; mais, porém, se esconde e acena. O sertão é uma espera enorme. Sertão: quem sabe dele é urubu, gavião, gaivota, esses pássaros: eles estão sempre no alto, apalpando ares com pendurado pé, com o olhar remedindo a alegria e as misérias todas. A vida é ingrata no macio de si; mas transtraz a esperança mesmo do meio do fel do desespero. A vida é muito discordada. Tem partes. Tem artes. Tem as neblinas de Siruiz. Tem as caras todas do Cão, e as vertentes do viver. Manter firme uma opinião, na vontade do homem, em mundo transviável tão grande, é dificultoso. Viver – não é? – é muito perigoso. Porque ainda não se sabe. Porque aprender-a-viver é que é o viver, mesmo. Enfim, cada um o que quer aprova, o senhor sabe: pão ou pães, é questão de opiniães... Feito flecha, feito faca, feito fogo. Vi: o que guerreia é o bicho, não é o homem. Até que, um dia, eu estava repousando, no claro estar, em rede de algodão rendada. Alegria me espertou, um pressentimento. Quando eu olhei, vinha vindo uma moça. Otacília. Meu coração rebateu, estava dizendo que o velho era sempre novo. Afirmo ao senhor, minha Otacília ainda se orçava mais linda, me saudou com o salvável carinho, adianto de amor. - Guimarães Rosa

+ Refresca teu coração. Sofre, sofre, depressa, que é para as alegrias novas poderem vir. - Guimarães Rosa

+ Ah, acho que não queria mesmo nada, de tanto que eu queria só tudo. Uma coisa, a coisa, esta coisa: eu somente queria era - ficar sendo! - Guimarães Rosa

+ Sertão: estes seus vazios. - Guimarães Rosa

+ Sapo não pula por boniteza, mas porém por precisão. - Guimarães Rosa

+ Inútil fugir, inútil resistir, inútil tudo. - Guimarães Rosa