Em verdade temos medo. Nascemos escuro. As existências são poucas: Carteiro, ditador, soldado. Nosso destino, incompleto.

E fomos educados para o medo. Cheiramos flores de medo. Vestimos panos de medo. De medo, vermelhos rios vadeamos.

Somos apenas uns homens e a natureza traiu-nos. Há as árvores, as fábricas, Doenças galopantes, fomes.

Refugiamo-nos no amor, este célebre sentimento, e o amor faltou: chovia, ventava, fazia frio em São Paulo.

Fazia frio em São Paulo… Nevava. O medo, com sua capa, nos dissimula e nos berça.

Fiquei com medo de ti, meu companheiro moreno, De nós, de vós: e de tudo. Estou com medo da honra.

Assim nos criam burgueses, Nosso caminho: traçado. Por que morrer em conjunto? E se todos nós vivêssemos?

Vem, harmonia do medo, vem, ó terror das estradas, susto na noite, receio de águas poluídas. Muletas

do homem só. Ajudai-nos, lentos poderes do láudano. Até a canção medrosa se parte, se transe e cala-se.

Faremos casas de medo, duros tijolos de medo, medrosos caules, repuxos, ruas só de medo e calma.

E com asas de prudência, com resplendores covardes, atingiremos o cimo de nossa cauta subida.

O medo, com sua física, tanto produz: carcereiros, edifícios, escritores, este poema; outras vidas.

Tenhamos o maior pavor, Os mais velhos compreendem. O medo cristalizou-os. Estátuas sábias, adeus.

Adeus: vamos para a frente, recuando de olhos acesos. Nossos filhos tão felizes… Fiéis herdeiros do medo,

eles povoam a cidade. Depois da cidade, o mundo. Depois do mundo, as estrelas, dançando o baile do medo.


Carlos Drummond De Andrade

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+ Ser feliz sem motivo é a mais autêntica forma de felicidade. - Carlos Drummond De Andrade

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+ QUADRILHA João amava Teresa que amava Raimundo que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili que não amava ninguém. João foi pra os Estados Unidos, Teresa para o convento, Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia, Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes que não tinha entrado na história. - Carlos Drummond De Andrade

+ Para Sempre Por que Deus permite que as mães vão-se embora? Mãe não tem limite, é tempo sem hora, luz que não apaga quando sopra o vento e chuva desaba, veludo escondido na pele enrugada, água pura, ar puro, puro pensamento. Morrer acontece com o que é breve e passa sem deixar vestígio. Mãe, na sua graça, é eternidade. Por que Deus se lembra - mistério profundo - de tirá-la um dia? Fosse eu Rei do Mundo, baixava uma lei: Mãe não morre nunca, mãe ficará sempre junto de seu filho e ele, velho embora, será pequenino feito grão de milho. - Carlos Drummond De Andrade

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