Sábio é o que se contenta com o espectáculo do mundo, E ao beber nem recorda Que já bebeu na vida, Para quem tudo é novo E imarcescível sempre.
Coroem-no pâmpanos. ou heras. ou rosas volúveis, Ele sabe que a vida Passa por ele e tanto Corta a flor como a ele De Átropos a tesoura.
Mas ele sabe fazer que a cor do vinho esconda isto, Que o seu sabor orgíaco Apague o gosto ás horas, Como a uma voz chorando O passar das bacantes.
E ele espera, contente quase e bebedor tranquilo, E apenas desejando Num desejo mal tido Que a abominável onda O não molhe tão cedo.
Fernando Pessoa
Outras frases de Fernando Pessoa
+ Vivo sempre no presente. O futuro, não o conheço. O passado, já o não tenho. - Fernando Pessoa
+ Vivem em nós inúmeros - Fernando Pessoa
+ Vivo sempre no presente. O futuro, não o conheço. O passado, já o não tenho. Pesa-me um como a possibilidade de tudo, o outro como a realidade de nada. Não tenho esperanças nem saudades. Conhecendo o que tem sido a minha vida até hoje — tantas vezes e em tanto o contrário do que eu a desejara —, que posso presumir da minha vida de amanhã senão que será o que não presumo, o que não quero, o que me acontece de fora, até através da minha vontade? Nem tenho nada no meu passado que relembre com o desejo inútil de o repetir. Nunca fui senão um vestígio e um simulacro de mim. O meu passado é tudo quanto não consegui ser. Nem as sensações de momentos idos me são saudosas: o que se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a história continua, mas não o texto. Breve sombra escura de uma árvore citadina, leve som de água caindo no tanque triste, verde da relva regular — jardim público ao quase crepúsculo —, sois, neste momento, o universo inteiro para mim, porque sois o conteúdo pleno da minha sensação consciente. Não quero mais da vida do que senti-la a perder-se nestas tardes imprevistas, ao som de crianças alheias que brincam nestes jardins engradados pela melancolia das ruas que os cercam, e copados, para além dos ramos altos das árvores, pelo céu velho onde as estrelas recomeçam. - Fernando Pessoa
+ Viver é ser outro. Nem sentir é possível se hoje se sente como ontem se sentiu: sentir hoje o mesmo que ontem não é sentir - é lembrar hoje o que se sentiu ontem, ser hoje o cadáver vivo do que ontem foi a vida perdida. - Fernando Pessoa
+ Viver não é necessário. Necessário é criar. - Fernando Pessoa