Frases de Carlos Drummond De Andrade

+ MANEIRA DE AMAR O jardineiro conversava com as flores, e elas se habituaram ao diálogo. Passava manhãs contando coisas a uma cravina ou escutando o que lhe confiava um gerânio. O girassol não ia muito com sua cara, ou porque não fosse homem bonito, ou porque os girassóis são orgulhosos de natureza. Em vão o jardineiro tentava captar-lhe as graças, pois o girassol chegava a voltar-se contra a luz para não ver o rosto que lhe sorria. Era uma situação bastante embaraçosa, que as outras flores não comentavam. Nunca, entretanto, o jardineiro deixou de regar o pé de girassol e de renovar-lhe a terra, na devida ocasião. O dono do jardim achou que seu empregado perdia muito tempo parado diante dos canteiros, aparentemente não fazendo coisa alguma. E mandou-o embora, depois de assinar a carteira de trabalho. Depois que o jardineiro saiu, as flores ficaram tristes e censuravam-se porque não tinham induzido o girassol a mudar de atitude. A mais triste de todas era o girassol, que não se conformava com a ausência do homem. "Você o tratava mal, agora está arrependido?" "Não, respondeu, estou triste porque agora não posso tratá-lo mal. É minha maneira de amar, ele sabia disso, e gostava". - Carlos Drummond De Andrade

+ De tudo fica um pouco. Não muito. - Carlos Drummond De Andrade

+ Amizade Como as plantas, a amizade não deve ser muito nem pouco regada. - Carlos Drummond De Andrade

+ As academias coroam com igual zelo o talento e a ausência dele. - Carlos Drummond De Andrade

+ Mãos dadas Não serei o poeta de um mundo caduco. Também não cantarei o mundo futuro. Estou preso à vida e olho meus companheiros. Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças. Entre eles, considero a enorme realidade. O presente é tão grande, não nos afastemos. Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas. Não serei o cantor de uma mulher, de uma história, não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela, não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida, não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins. O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, a vida presente. - Carlos Drummond De Andrade

+ Amar se aprende amando. - Carlos Drummond De Andrade

+ Quem gosta de escrever cartas para os jornais não deve ter namorada. - Carlos Drummond De Andrade

+ O pássaro é livre na prisão do ar. O espírito é livre na prisão do corpo. - Carlos Drummond De Andrade

+ Não se mate Carlos, sossegue, o amor é isso que você está vendo: hoje beija, amanhã não beija, depois de amanhã é domingo e segunda-feira ninguém sabe o que será. Inútil você resistir ou mesmo suicidar-se. Não se mate, oh não se mate, Reserve-se todo para as bodas que ninguém sabe quando virão, se é que virão. O amor, Carlos, você telúrico, a noite passou em você, e os recalques se sublimando, lá dentro um barulho inefável, rezas, vitrolas, santos que se persignam, anúncios do melhor sabão, barulho que ninguém sabe de quê, praquê. Entretanto você caminha melancólico e vertical. Você é a palmeira, você é o grito que ninguém ouviu no teatro e as luzes todas se apagam. O amor no escuro, não, no claro, é sempre triste, meu filho, Carlos, mas não diga nada a ninguém, ninguém sabe nem saberá. Não se mate - Carlos Drummond De Andrade

+ As obras-primas devem ter sido geradas por acaso; a produção voluntária não vai além da mediocridade. - Carlos Drummond De Andrade

+ CONSOLO NA PRAIA Vamos, não chores... A infância está perdida. A mocidade está perdida. Mas a vida não se perdeu. O primeiro amor passou. O segundo amor passou. O terceiro amor passou. Mas o coração continua. Perdeste o melhor amigo. Não tentaste qualquer viagem. Não possuis casa, navio, terra. Mas tens um cão. Algumas palavras duras, em voz mansa, te golpearam. Nunca, nunca cicatrizam. Mas, e o 'humour'? A injustiça não se resolve. À sombra do mundo errado murmuraste um protesto tímido. Mas virão outros. Tudo somado, devias precipitar-te, de vez, nas águas. Estás nu na areia, no vento... Dorme, meu filho. - Carlos Drummond De Andrade

+ O Tempo Passa? Não Passa O tempo passa? Não passa no abismo do coração. Lá dentro, perdura a graça do amor, florindo em canção. O tempo nos aproxima cada vez mais, nos reduz a um só verso e uma rima de mãos e olhos, na luz. Não há tempo consumido nem tempo a economizar. O tempo é todo vestido de amor e tempo de amar. O meu tempo e o teu, amada, transcendem qualquer medida. Além do amor, não há nada, amar é o sumo da vida. São mitos de calendário tanto o ontem como o agora, e o teu aniversário é um nascer toda a hora. E nosso amor, que brotou do tempo, não tem idade, pois só quem ama escutou o apelo da eternidade. - Carlos Drummond De Andrade

+ Lira do amor romântico Ou a eterna repetição Atirei um limão n’água e fiquei vendo na margem. Os peixinhos responderam: Quem tem amor tem coragem. Atirei um limão n’água e caiu enviesado. Ouvi um peixe dizer: Melhor é o beijo roubado. Atirei um limão n’água, como faço todo ano. Senti que os peixes diziam: Todo amor vive de engano. Atirei um limão n’água, como um vidro de perfume. Em coro os peixes disseram: Joga fora teu ciúme. Atirei um limão n’água mas perdi a direção. Os peixes, rindo, notaram: Quanto dói uma paixão! Atirei um limão n’água, ele afundou um barquinho. Não se espantaram os peixes: faltava-me o teu carinho. Atirei um limão n’água, o rio logo amargou. Os peixinhos repetiram: É dor de quem muito amou. Atirei um limão n’água, o rio ficou vermelho e cada peixinho viu meu coração num espelho. Atirei um limão n’água mas depois me arrependi. Cada peixinho assustado me lembra o que já sofri. Atirei um limão n’água, antes não tivesse feito. Os peixinhos me acusaram de amar com falta de jeito. Atirei um limão n’água, fez-se logo um burburinho. Nenhum peixe me avisou da pedra no meu caminho. Atirei um limão n’água, de tão baixo ele boiou. Comenta o peixe mais velho: Infeliz quem não amou. Atirei um limão n’água, antes atirasse a vida. Iria viver com os peixes a minh’alma dolorida. Atirei um limão n’água, pedindo à água que o arraste. Até os peixes choraram porque tu me abandonaste. Atirei um limão n’água. Foi tamanho o rebuliço que os peixinhos protestaram: Se é amor, deixa disso. Atirei um limão n’água, não fez o menor ruído. Se os peixes nada disseram, tu me terás esquecido? Atirei um limão n’água, caiu certeiro: zás-trás. Bem me avisou um peixinho: Fui passado pra trás. Atirei um limão n’água, de clara ficou escura. Até os peixes já sabem: você não ama: tortura. Atirei um limão n’água e caí n’água também, pois os peixes me avisaram, que lá estava meu bem. Atirei um limão n’água, foi levado na corrente. Senti que os peixes diziam: Hás de amar eternamente. - Carlos Drummond De Andrade

+ Para você ganhar belíssimo Ano Novo... Não precisa fazer lista de boas intenções para arquivá-las na gaveta. Não precisa chorar de arrependimento pelas besteiras consumadas nem parvamente acreditar que por decreto da esperança a partir de Janeiro as coisas mudem e seja claridade, recompensa, justiça entre os homens e as nações, liberdade com cheiro e gosto de pão matinal, direitos respeitados, começando pelo direito augusto de viver. Para ganhar um ano-novo que mereça este nome, você, meu caro, tem de merecê-lo, tem de fazê-lo novo, Eu sei que não é fácil mas tente, experimente, consciente. É dentro de você que o Ano Novo dorme e espera desde sempre. - Carlos Drummond De Andrade

+ Sim, tenho saudades. Sim, acuso-te porque fizeste o não previsto nas leis da amizade e da natureza nem nos deixaste sequer o direito de indagar porque o fizeste, porque te foste - Carlos Drummond De Andrade

+ Cuidado por onde andas, que é sobre os meus sonhos que caminhas. - Carlos Drummond De Andrade

+ Se um dia olhar para o céu e não te ver, é que sou a onda do mar e não consigo te esquecer, sou feliz do teu lado sem do seu lado estar, pois você é isolado no meu modo de pensar, quando estou triste e não tem solução, lembro que você existe e mora no meu coração! - Carlos Drummond De Andrade

+ Por que Deus permite que as mães vão-se embora? Mãe não tem limite, é tempo sem hora, luz que não apaga quando sopra o vento e chuva desaba, veludo escondido na pele enrugada, água pura, ar puro, puro pensamento. - Carlos Drummond De Andrade

+ Convite Triste Meu amigo, vamos sofrer, vamos beber, vamos ler jornal, vamos dizer que a vida é ruim, meu amigo, vamos sofrer. Vamos fazer um poema ou qualquer outra besteira. Fitar por exemplo uma estrela por muito tempo, muito tempo e dar um suspiro fundo ou qualquer outra besteira. Vamos beber uísque, vamos beber cerveja preta e barata, beber, gritar e morrer, ou, quem sabe? beber apenas. Vamos xingar a mulher, que está envenenando a vida com seus olhos e suas mãos e o corpo que tem dois seios e tem um embigo também. Meu amigo, vamos xingar o corpo e tudo que é dele e que nunca será alma. Meu amigo, vamos cantar, vamos chorar de mansinho e ouvir muita vitrola, depois embriagados vamos beber mais outros sequestros (o olhar obsceno e a mão idiota) depois vomitar e cair e dormir. (Em: Brejo das Almas) - Carlos Drummond De Andrade

+ Carlos, sossegue, o amor é isso que você está vendo: hoje beija, amanhã não beija, depois de amanhã é domingo e segunda-feira ninguém sabe o que será. - Carlos Drummond De Andrade

+ Por isso, preste atenção nos sinais - não deixe que as loucuras do dia-a-dia o deixem cego para a melhor coisa da vida: O AMOR. - Carlos Drummond De Andrade

+ A liberdade é defendida com discursos e atacada com metralhadoras. - Carlos Drummond De Andrade

+ O chão é cama O chão é cama para o amor urgente, amor que não espera ir para a cama. Sobre o tapete ou duro piso, a gente compõe de corpo e corpo a úmida trama. E para repousar do amor, vamos à cama. - Carlos Drummond De Andrade

+ Fácil é saber que está rodeado por pessoas queridas. Difícil é saber que está se sentindo só no meio delas... - Carlos Drummond De Andrade

+ Não basta sentir a chegada dos dias lindos. É necessário proclamar: "Os dias ficaram lindos". - Carlos Drummond De Andrade