Das Sete Canções de Declíno

Um frenesi hialino arrepiou Pra sempre a minha carne e a minha vida. Foi um barco de vela que parou Em súbita baía adormecida…

Baía embandeirada de miragem, Dormente de ópio, de cristal e anil. Na ideia de um país de gaze e Abril, Em duvidosa e tremulante imagem…

Parou ali a barca – e, ou fosse encanto, Ou preguiça, ou delírio, ou esquecimento, Não mais aparelhou… – ou fosse o vento Propício que faltasse: ágil e santo…

…Frente ao porto esboçara-se a cidade, Descendo enlanguescida e preciosa: As cúpulas de sombra cor de rosa As torres de platina e de saudade.

Avenidas de seda deslizando, Praças de honra libertas sobre o mar… Jardins onde as flores fossem luar; Lagos – carícias de âmbar flutuando…

Os palácios a rendas e escumalha, De filigrana e cinza as catedrais – Sobre a cidade a luz – esquiva poalha Tingindo-se através longos vitrais…

Vitrais de sonho a debruá-la em volta, A isolá-la em lenda marchetada: Uma Veneza de capricho – solta, Instável, dúbia, pressentida, alada…

Exílio branco – a sua atmosfera, Murmúrio de aplausos – seu brou-há-há… E na Praça mais larga, em frágil cera, Eu – a estátua que nunca tombará…


Mário De Sá Carneiro