⁠NOSSA SENHORA APARECIDA

Eu não sou religioso! Se me considero católico, é por conta da tradição familiar. Mesmo assim, não levo a coisa a sério. Conversando com um padre muito inteligente, com discurso agradável, fui perguntado sobre qual era a minha religião. Respondi: - Sou um católico sem-vergonha! Ele sorriu e disse: - Não existe católico sem-vergonha, meu filho! Por que você se “acha” católico sem-vergonha? Expliquei: - Não frequento igrejas, não gosto de missas, abomino longos sermões, principalmente de casamentos, nem gosto de conversar sobre isso, entre outras coisas. Ele me olhou com uma certa decepção, pois aquilo não estava de acordo com a nossa agradável conversa anterior, e comentou: - Sabe? Você é o primeiro católico sem-vergonha que eu conheço na vida. Rimos e continuamos a conversa, sempre bem-humorada. Respeitando todas as religiões verdadeiras, se não tenho uma, tenho extremo respeito também pela cultura mundial e, com muito carinho e orgulho, pela brasileira. Como poderia um arquiteto desconsiderar o patrimônio histórico e artístico, a história, o folclore, a filosofia, as artes, contidas no universo religioso? Entretanto, foi um texto emocionante, de uma amiga que perdeu seu filho, minha inspiração para escrever este. Ela se reportou a recentes acontecimentos, nos quais a Basílica de Aparecida do Norte foi profanada pela estupidez, pela estultícia de ignóbeis repugnantes. Lembrei de minha viagem a Roma e visita ao Vaticano! A guia daquele momento da viagem disse não poder entrar conosco na Basílica de São Pedro, mas sugeriu que prestássemos atenção na escultura da Pietà, de Michelangelo, com uma pequena descrição dos detalhes da obra. Já frente à maravilha, com cópia fiel na Catedral de Brasília, atendi à recomendação da moça e observei as mãos da Santa. A direita tenta abarcar todo o corpo do filho, como uma proteção. Parece puxar para si mesma. A esquerda questiona o porquê daquela tragédia. O rosto jovem demonstra sua resignação, sua dor infinita, seu irrestrito amor de mãe! Abaixei um pouco a cabeça, sem tirar os olhos de seu semblante, mas já não era apenas reverência. Era vergonha, por ser da mesma espécie dos torturadores e assassinos. As lágrimas correram, mas não dos olhos. Foi do coração mesmo, como diria um amigo poeta. E o trecho de uma canção insistia em me fazer ouvi-la: “Como eu não sei rezar, só queria mostrar meu olhar, meu olhar, meu olhar”. Nunca mais deixei de ver naquele Cristo morto todos os filhos vitimados pelas doenças curáveis, pela violência deplorável, pela estupidez das guerras. Nunca mais deixei de ver em Nossa Senhora todas as mães flageladas pelo mesmo motivo. Vejo também as mães aflitas, que oram pela proteção a seus filhos e aos filhos de todas as mulheres do mundo. Salve Nossa Senhora Aparecida! Salve-nos, Nossa Senhora Aparecida!

Sérgio Antunes de Freitas Outubro de 2022


Sérgio Antunes De Freitas